7.4.10

"É preciso pôr a Europa a viver no Algarve"

Presidente da Confederação do Turismo Português assume novo mandato até 2013


Relançar o Algarve como sítio para viver o ano inteiro ou atrair empresas multinacionais a Lisboa é o projecto da Confederação do Turismo Português (CTP), onde José Carlos Pinto Coelho foi reconduzido na presidência até 2013. Com o turismo em Portugal a sofrer quebras de 30%, defende que é preciso mudar de visão e que o programa Allgarve "já não interessa".
  
Recuperar o turismo é a meta que domina a agenda da Confederação. Acredita numa recuperação em 2010?
Não, em 2010 vamos ter o resultado do que fizemos em anos anteriores, que não nos dá grande optimismo. Para este novo mandato, temos um slogan que é criar condições de crescimento. Significa alinhar um conjunto de factores que nos permitam crescer outra vez. Desde 2000 que o caminho que está a ser seguido no país não é o melhor. Portugal precisa de ideias novas, projectos fortes e diferentes dos que existiam até agora, porque o mundo é diferente do que pensávamos há dois, três anos. Não vale a pena continuar a insistir que o problema é promoção ou baixar preços. É preciso traçar novas metas.

Que metas são essas?
No turismo, temos uma ideia clara do que tem de acontecer. Vamos deixar o Governo e os partidos políticos discutirem os seus problemas, quanto menor for a intervenção do sector público melhor para nós. Um exemplo recente é a campanha do Allgarve, em que nós não fomos ouvidos. Foi a campanha que apareceu na altura para promover o Algarve, e foi o que foi. No mundo novo que existe, tenho a certeza de que se deve promover o Algarve como um bom sítio para viver. Passar a vender em inglês "Algarve, a Place for Living", em vez de Allgarve. É uma visão revolucionária e atrevida para o Algarve.

Mas não é o que já está a ser feito com as segundas residências?
Não. Estamos a falar de criar uma base no Algarve para a Europa viver lá. E isto não custa dinheiro. Comparado com o resto dos projectos, é quase a custo zero, porque as infra-estruturas já existem. O que é caro é fazer uma Vilamoura II. Há investimentos brutais que estão feitos, são lindos, mas neste momento viver só da sazonalidade não dá, porque há destinos muito mais baratos que nos estão a roubar os clientes. Estamos mal preparados para o que está a acontecer neste momento. Temos infra-estruturas caras instaladas, hotéis bons, estradas boas, e viver só do turismo sazonal é manifestamente pouco, não traz riqueza. Veja-se o que está a acontecer com o sul de Espanha, que está quase vazio, com a maioria dos hotéis fechados. E no Algarve, o primeiro trimestre deste ano foi pior do que o ano passado, o que parecia praticamente impossível. O actual modelo do Algarve está esgotado. Para a Europa civilizada e com dinheiro, é um sítio luxuoso para se viver, com as infra-estruturas, os hotéis e os apartamentos que tem.

Como vender esta ideia? Através de uma campanha?
Claro. E não desatar a vender antes de alinhar os ingredientes todos, desde segurança, qualidade dos empreendimentos que estão construídos no Algarve, mostrar o que já fizemos com a estrada 125, o hospital novo, dizer que estamos a fazer um centro de congressos para 10 mil pessoas. Isto tem de ser vendido como um produto global. Com a mudança que houve no mundo, com a Turquia a competir connosco, o Algarve é bom de mais, tem estruturas boas de mais e é preciso tirar partido delas, o que implica pôr outra ideia em cima.

Defende então o fim do Allgarve?
Já foi, teve o seu tempo. Com o que se aprendeu, neste momento já não interessa. A partir de agora, interessa vender o Algarve como destino para se viver o ano inteiro. Seria bom ter o Algarve com mais 50% de ocupação, com uma base sólida de gente a viver lá, tal como no sul de França. Neste momento, temos dramaticamente de aumentar a quantidade, senão o nosso futuro vai ser mau. O que temos instalado é de mais para os clientes que temos. Portugal preparava-se para uma época de turismo de ouro, era a visão de há três, quatro anos, com grandes empreendimentos e, claro, quem estava a investir mais sofre agora mais. Mas isso é passado, interessa é pôr em marcha projectos que tragam crescimento.

Como correu 2009?
Correu pessimamente, a maior parte das empresas está em crise, pode-se falar de uma diminuição de 30% na facturação. Porque os nossos clientes tradicionais não têm dinheiro para vir para Portugal e vão para destinos mais baratos. Em Inglaterra há uma crise enorme, a libra está quase igual ao euro. No norte de França, decidiram não perder quota de mercado e cotar os preços em libras. Lição: em momentos de crise, há que ter coragem e agilidade para fazer diferente. O problema crucial da nossa sobrevivência é que o desemprego tem de diminuir, o que obriga a projectos globais, também para cidades como Lisboa ou Porto, em vez de dar tiros casuísticos. A hotelaria de cinco estrelas caiu no ano passado 30% em receitas e as cadeias multinacionais estão a sair de Lisboa. O que nós propomos é Lisboa como capital europeia de negócio, como Madrid ou Barcelona. E se queremos uma Lisboa para as empresas se instalarem ou o Algarve como um sítio para viver, claro que temos de mexer em impostos, criar um sistema atractivo para as empresas se instalarem ou para quem compra casa.

Defende o TGV, mas o presidente da Jerónimo Martins, Alexandre Soares dos Santos já questionou: porquê um TGV Lisboa-Madrid a €120, quando uma low-cost o faz por €20?
Discordo totalmente dessa visão. Não tenho dúvida de que o TGV é um elemento de ligação fortíssimo. É pena que a ligação a Vigo não seja feita, porque sem dúvida que o TGV era uma maneira de o Porto melhorar muito.

E em relação ao novo aeroporto, quais as propostas da Confederação?
Se o novo aeroporto em Alcochete, for competitivo, todos nós o queremos. Mias o nosso problema principal é que o actual aeroporto de Lisboa é caro. E o novo aeroporto vai ser mais barato? Não vale a pena iludir as coisas, porque se for mais caro as pessoas não vêm.

Defende, então, manter a Portela?
Deve-se manter, enquanto o movimento for o que é. Não vale a pena olhar para trás e para as previsões feitas, que já estão totalmente erradas. O que interessa, num prazo de 6, 7 anos, são ligações que permitam chegar mais depressa e mais barato a Lisboa. Pôr já, e de preferência ontem, o terminal 2 a funcionar para low-cost. Quanto às taxas aeroportuárias, que em Lisboa são cinco vezes superiores às de Madrid, é baixá-las. Depois, pode-se começar a avançar com o aeroporto de Alcochete, de forma modular. Se for possível, venha ele. Mas o dado-base para o projecto é que tem de conseguir ser barato, com taxas a competir com Espanha.

Como vê a realização da Ryder Cup em Portugal?
Como golfista, era um sonho brutal ter a Ryder Cup em Portugal. Idealmente, projectos como este deviam ser agarrados a um calendário de grandes eventos. Mas nós só começámos em Janeiro a trabalhar na Ryder Cup, enquanto outros países já o estão a fazer há dois anos e meio, como a Alemanha. E não vai ser fácil competir com a Alemanha.

Perante a discussão do Programa de Estabilidade e Crescimento (PEC) em Portugal, vê condições para as metas de crescimento da CTP tomarem corpo?
Não, o que está a ser discutido é um compromisso sem base em projectos. No Orçamento do Estado e actual PEC não vejo lá nada que seja crescimento, por mais que olhe para eles. Estamos a falar em gastar menos no sector do Estado, acho muito bem e até devia ser muito menos. Se calhar, neste momento, é a nós, privados, que cabe ter as costas largas e força suficiente para lançar projectos diferentes, e na Confederação do Turismo estamos mais bem preparados, com uma comissão executiva, para sermos aqui os ‘ideólogos’. Porque se continuarmos a fazer o mesmo, não vai resultar.


CAVALOS-DE-BATALHA DA CTP
  • Promover o Algarve como sítio para viver o ano inteiro (em vez do Allgarve) e Lisboa como sede de empresas multinacionais
  • Criar um sistema de impostos atractivo para as empresas se instalarem em Portugal 
  • Abrir o termina! 2 da Portela a voos de baixo custo (low-cost) 
  • Reduzir taxas aeroportuárias, cinco vezes mais caras do que em Espanha 
  • IVA na restauração à taxa reduzida de 5% 
  • Taxas bonificadas nas facturas de água, luz e gás para hotelaria e turismo como medida temporária até 2013 
  • A nível laboral, negociar o banco de horas com os sindicatos


Construir Alcochete por módulos
O presidente da Confederação do Turismo Português defende que o aeroporto de Alcochete deve ser construído "por módulos, consoante as necessidades que se forem sentindo na realização dos projectos e na ligação à alta velocidade". Segundo Pinto Coelho, o aeroporto da Portela vai poder utilizado por um período de tempo superior ao que estava previsto. E frisa que tudo mudou desde que foi lançado o projecto do novo aeroporto. "As previsões feita há três anos estão totalmente erradas. Esperávamos que o tráfego na Portela tivesse crescido 16% e diminuiu 2%, o que é uma diferença de 20%". Para a CTP, o que interessa agora é apostar em “voos low-cost que tragam mais visitantes a Portugal a preços competitivos".


Conceição Antunes, Expresso